segunda-feira, agosto 07, 2006

Romances Psicológicos Em Machado de Assis, Um Estudo Literário.

Romances Psicológicos Em Machado de Assis


Antes de mais nada, apresentemo-nos ao homem de letras.
Machado de Assis nasce em 21 de Junho de 1839 para fazer história na literatura brasileira. E isto não só pelo seu legado de obras, que contém alguns dos grandes romances de nossa biblioteca nacional como Memórias Póstumas de Brás Cubas, mas também pela contribuição crítica que dispôs frente aos movimentos que lhe rodearam a existência literária, seja pela influencia que trouxeram ao seu criar artístico ou mesmo pela simples contemporaneidade com o escritor brasileiro.
Não sendo ele romântico, realista, naturalista, parnasianista ou simbolista pura e simplesmente, pretendeu guiar-se em meio a cada uma destas vertentes para desenvolver uma escrita particular, onde o excesso de cada um se tornasse a comedida busca de uma essência do ser humano. Um tipo de fusão do trágico com o cômico, só alcançada nele a partir de Brás Cubas, irá de sobremodo realizar um tipo de visão particular definitiva de Machado de Assis sobre a própria função da arte literária: ser uma espécie de consolo metafísico ao mal também metafísico de todo o absurdo da existência. Seria o papel principal da arte, encarar de frente o sem-sentido; os males da existência que não podem ser abrigados em nenhuma perspectiva absoluta de fonte de significações. Correntes literárias como a romântica ou naturalista sempre conservariam para Machado de Assis, uma possibilidade otimista aos casos da vida, como se a harmonia de alguns elementos de nossa existência dessem a ordem do dia às relações sempre intensas entre os homens. O mal irremediável e fatal corresponderia nesses termos ao interesse central do "artista trágico", sendo o ente desbravador dos males irremediáveis e fatais da existência para enfim trazer uma misteriosa consolação metafísica resultante deste enfrentamento (B. Filho, 1947*).
Ora, deixando de lado este adendo primeiro sobre o escritor, que pelo objetivo da crítica e conhecimento do crítico são em alguma medida superficiais, vejamos uma inferência talvez precipitada na crítica citada sobre o perfil psicológico dos primeiros romances de Machado de Assis, que se limitaria a sua obra inaugural Ressureição. Isso porque há desde Ressureição até Iaiá Garcia (que antecede Brás Cubas) e entre eles A Mão E A Luva e Helena, o que poderia se definir por um estudo profundo sobre o desenho psicológico que permeia as relações e escolhas amorosas. Algo como a sugestão de um jogo de peças sociais compostas por damas e pretendentes que se encaixam tendo em vista enlaces (também) sociais diversos, onde as virtudes humanas do romantismo ou o a frieza do realismo não deixam de existir, em tramas de finais surpreendentes.
Nada pouco atual, deveras. Hoje mais do que nunca tendemos a nos surpreender pessoalmente pelo modo como figuras de adoração amorosa tem presentemente na vida social um contorno bem definido. Não há aquele que não consiga supor ainda que ofuscadamente o perfil de sua(seu) adorada(o) ou a situação em que desejaria estar no momento em que talvez haveremos de encontrá-la(o). Emoção e razão têm papel equânime na definição do “ama-me” ou “amo-te” em Machado de Assis, quando uma interfere na outra para provar-nos o quão decisivas são estas escolhas mentais para o desenlace das relações humanas. Isto, mais de um século atrás, foi ― como pode-se perceber na primeira fase dos romances do autor, que tem em Brás Cubas o divisor de águas ― objeto de interesse e inspiração para seus quatro primeiros romances, diferentemente da exclusividade que se deposita em Ressurreição.

Nas Obras.

O primeiro Romance, Ressureição, conta na verdade uma estória simples. O pretendente ciumento de uma viúva jovem luta contra sua própria desconfiança frente às pessoas que se encontram a sua volta, inclusive a viúva, para viver o amor que tem por ela. Sua personalidade conflituosa padece frente a qualquer espectro de traição que possa surgir e termina por estragar a (talvez) única oportunidade de felicidade que realmente se monta em sua vida. O desfecho não é dos mais alegres.
Mas a forma pela qual Machado de Assis concebe a ocorrência destes elementos na mente humana está descrita literalmente em Iaiá Garcia. E isto se dá quando Jorge, ao afastar-se de Estela, vê-se encurralado por um conflito onde leis sociais e leis do coração dispõem-se em vetores até então opostos na definição de seu destino. Embora seu coração aponte Estela como sua amada incondicional, a fatuidade social que circunda seu sentimento os afasta, principalmente no que diz respeito à discordância de Valéria (mãe de Jorge) quanto à união. O conflito aparece na mente de Jorge como um mal insuperável, onde possibilidade de ir para a guerra crava em seu destino a condição cruel de não ter as duas naturezas (ou leis) em comunhão para frutificar o seu amor por Estela: “Tua mãe é que tem razão, brandava uma voz interior; ias descer a uma aliança indigna de ti; e se não soubesse respeitar nem a tua pessoa nem o nome de teus pais, justo é que pagues o erro indo correr a sorte da guerra. A vida não é uma égloga virgiliana, é uma convenção natural, que se não aceita com restrições, nem se infringe sem penalidade. Há duas naturezas, e a natureza social é tão legítima e impediosa como a outra. Não se contrariam, completam-se; são as duas metades do homem, e tua ias ceder à primeira, desrespeitando as leis necessárias da segunda”.
Aparece, pois, como é o braço central da compreensão da arte machadiana, um enlace psicológico de dois elementos que de modo algum convergem a um fim harmônico: neste caso, a guerra do Paraguai, onde Jorge servirá ao exército. O amor que nele existe pela lei do coração tem a falta das leis sociais que poderiam fazê-lo subsistir e florescer, o que resultará em seu desgaste quase completo com o passar do tempo. Afinal, as duas naturezas completam-se. Na falta de uma, a outra não pode subsistir. E o amor tende realmente a se esgotar, quando Jorge termina por amar e desposar Iaiá Garcia, enteada de Helena. Por fim mesmo Iaiá aparenta ter desenvolvido o amor por Jorge apenas pelo interesse individual de afastá-lo da harmonia de seu próprio lar ― de afasta-lo de Estela, que se encontra casada com seu pai. Aqui, por último, o amor nasce de uma fatuidade social, e nutrindo-se da correspondência afetiva consegue florescer mesmo sem um berço virtuoso, romântico.
Já em A Mão E A Luva e Helena, este caráter da obra, que nestas também é decisivo, aparece muito mais em função do desenlace final da estória. No primeiro livro, Guiomar se vê a princípio cortejada por dois rapazes, Estevão e Jorge, que lhe tocam de modos diferentes. Jorge é escolha de sua madrinha, mas não a ama muito; Estevão ama-lhe de todo coração, mas apenas isso, sem tocar-lhe de todo. Só Luís, que tem-lhe afeto sincero mas não tão exacerbado quanto Estevão, e possibilita a vida promissora e socialmente superior que Jorge não lhe proporcionaria, termina por tocar-lhe a alma e ser o bem aventurado que possuirá seu coração e sua vida. A dualidade se completa nela e para ela.
Por fim, Estevão, apesar de ser declarado irmão de Helena, conhecendo-a já quando mulher, termina por amá-la de todo coração. Quando descobre não ser ela sua irmã, e um e outro se admitem apaixonados, mas o fato de terem se tornado publicamente irmãos e a força das circunstâncias os impede de reverter o quadro, quee impõe o fim trágico da morte de Helena.
Destas evidências surge a discordância. Para Barreto filho, de quem extraí a síntese do pensamento artístico de Machado de Assis, “Os outros romances que se seguem, A Mão E A Luva, Helena e Iaiá Garcia, representam uma regressão aos moldes existentes. Triunfa neles a tendência vitoriana, volta a predominar a influência do ambiente, o esforço para julgar o impulso e penetração psicológica, e substituí-lo pelo jogo das situações romanescas, desenrolando-se no belo quadro social do segundo reinado”. Porém, o que surge na verdade destas obras é a composição de dois elementos determinantes para o desenrolar de uma situação psicológica. Uma natureza emocional e outra social que não se sobrepõem uma à outra, mas representam partes de um todo a estar em consonância para que os amores se realizem e as paixões não se esgotem. Afetos gratuitos podem verter fatuidades sociais ou não, da mesma forma que fatuidades podem gerar paixões, ou não gerar. Mas é só na dualidade essencial que se compreende o sucesso do sentimento e da união matrimonial em Machado de Assis. E essa dualidade define tanto o social quanto o psicológico. Tudo, por fim, resvalará na incerteza cruel por não haver um elemento claro e harmonizador das regras da existência humana, o que desde já sugere a visão trágica que se confirmará em Brás Cubas.

* Em Machado de Assis, Obra Completa Em Três Volumes. Condensado de
Introdução a Machado de Assis, RJ, Agir, 1947.


Por Rodrigo Lessa

4 comentários:

Anônimo disse...

Pô Rodrigo, fiquei até com vontade de ler uns romances. Acho que vou pegar aquele livro do Vinícius pra começar a folhear.

Anônimo disse...

O de Vinícius só tem poesia Feijon, ele não fez romances não...mas de qualquer forma vale a pena.
Neste tipo de coleção que tem em sua casa, o ideal é ler a introdução sobre o autor - que dependendo do volume tem quase o tamanho de um livro - e depois ir lendo as obras desde o início, que estão cronologicamente organizadas. Isso é ótimo porque você vê o crescimento intelectual do escritor, e percebe os nuances das críticas que existem na introdução do volume.
E é bom viu bicho...a cada estímulo que um escritor me causa através de poesia ou romance eu me convenço da não-predominância da ciência enquanto meio mais eficaz de compreensão da realidade da vida.

Anônimo disse...

eu amei eu so tenho 10 anos mais adoro ler sou a melhor da turma na leitura e minha mãe vai me da um livro

tatiana disse...

eu tb amei e sou a melhor da turma pq eu e minha irmã somos gemeas so q eu come scei a estudar primeiro e e por isso q eu estou no 8ºano minha mãe tb vai compra livro pra min so q e mais muito mais